Invasão do capitólio ou sintoma de doença na Democracia

A tolerância é frequentemente apresentada como um princípio essencial para a estabilidade das relações internacionais e sociais. No entanto, na prática, raramente é um ato de livre escolha. Será que todos podem realmente ser tolerantes ou será a tolerância um privilégio dos que possuem poder suficiente para exercê-la sem consequências? A recente decisão de Donald Trump de impor sanções ao Canadá, México e China ilustra bem essa realidade: enquanto alguns países foram forçados a ceder e negociar, outros escolheram resistir. Isso demonstra que a tolerância só pode existir quando há margem para decidir – sem essa liberdade, ela não passa de uma aceitação imposta.

Ao impor sanções ao Canadá e ao México, Trump colocou estes países numa posição de fragilidade económica. Apesar das suas reações iniciais de indignação, ambos acabaram por procurar um acordo, ligando a Trump para negociar. O que aconteceu aqui não foi um ato de tolerância genuína, mas sim uma necessidade estratégica. O Canadá e o México simplesmente não estavam em posição de enfrentar os Estados Unidos sem comprometer gravemente as suas economias. Perceberam rapidamente que resistir era inviável e que a melhor saída seria encontrar um compromisso que limitasse os danos. A tolerância, neste caso, não foi uma escolha – foi uma obrigação ditada pelas circunstâncias.

A China, por outro lado, adotou uma postura diferente. Em vez de procurar um compromisso imediato, respondeu com medidas retaliatórias e reforçou a sua posição, apostando na sua capacidade económica para suportar o impacto das sanções. A diferença entre a reação da China e a dos seus vizinhos americanos não é uma questão de moralidade ou de diplomacia, mas de poder. A China pode dar-se ao luxo de não ser tolerante porque tem força suficiente para aguentar as consequências da sua resistência. Este episódio demonstra que a tolerância não é uma virtude inata das nações ou dos indivíduos – ela é ditada pela relação de forças. Os mais poderosos podem decidir quando e como exercê-la, enquanto os mais fracos são obrigados a aceitar as circunstâncias impostas.

Trump não estava a agir de forma tolerante quando impôs sanções, mas também não precisava de o ser. O seu poder económico e político permitiu-lhe adotar uma posição de imposição, enquanto o Canadá e o México tiveram de adotar uma postura “tolerante”, não porque quisessem, mas porque não tinham outra opção viável. A China, por sua vez, mostrou que pode rejeitar essa posição, porque tem meios para suportar o confronto. Esta dinâmica reflete-se também na vida em sociedade: indivíduos ou grupos que possuem força suficiente para defender as suas posições podem escolher ser tolerantes ou não, enquanto aqueles que não têm alternativa acabam por confundir a sua submissão com tolerância.

Muitas vezes, a tolerância é promovida como um ideal universal, mas a verdade é que ela só existe quando há poder suficiente para exercê-la sem receios. Nenhum país ou sociedade é infinitamente tolerante – os limites da tolerância são definidos pelas circunstâncias e pelas relações de força. Na prática, os fortes escolhem quando e como ser tolerantes, enquanto os fracos não têm escolha senão aceitar as regras do jogo. Quando a tolerância não é uma escolha livre, ela não é tolerância – é submissão.

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