Beatriz Vinha: “Ideias frescas dos jovens” são essenciais na defesa dos oceanos
Fotografia: Direitos Reservados

A bióloga Beatriz Vinha foi um dos 150 jovens que marcou presença na Conferência dos Oceanos, organizada pelas Nações Unidas, que decorreu em Lisboa, entre 24 a 26 de junho e contou a presença do Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, do Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa e do ator Jason Mamoa.

A jovem bióloga de 26 anos, natural de Penafiel, mas com ligações familiares em Paços de Ferreira, encontra-se atualmente em Itália – onde está a fazer o doutoramento na Universidade de Salento, investigando a ecologia dos corais do oceano profundo de Cabo Verde – integrou uma equipa de cinco elementos (e da qual fizeram parte mais quatro jovens delegados do México, Chile, Zimbábue e Noruega) que trabalhou, durante 24 horas, numa solução para a falta de mapeamento do oceano.

Em entrevista ao Jornal IMEDIATO, Beatriz Vinha falou da participação na conferência e do projeto que defendeu e alertou para a necessidade de o Poder Central fazer mais investimento na ciência, assim como “decisões ousadas por parte dos decisores políticos” pela defesa dos oceanos. Disse ainda que os jovens terão um papel fundamental nesta tarefa por serem “a geração mais qualificada de sempre” e poderem dar o seu contributo com “ideias frescas”.

– Participou na Conferência dos Oceanos, como representante dos jovens portugueses do evento. Como surgiu o convite?

A organização Sustainable Ocean Alliance, co-organizadora do evento especial da Conferência dos Oceanos “Youth and Innovation Forum”, abriu candidaturas para escolher 150 jovens de todo o mundo para participar no evento, representando o seu país. Entre mais de mil candidaturas, a minha foi escolhida para ser jovem delegada, representante de Portugal, no Fórum que decorreu no fim-de-semana anterior à conferência, permitindo-me assim participar também na Conferencia dos Oceanos.

– Qual foi a sua participação no evento?

No Fórum, os 150 jovens foram divididos em equipas de cinco elementos, para trabalhar numa solução para um problema do oceano, durante 24 horas. A minha equipa era composta por mim e por mais quatros jovens delegados do México, Chile, Zimbábue e Noruega. Atualmente, apenas 20% dos fundos marinhos estão mapeados com dados de alta resolução, por isso, a nossa solução tinha como objetivo contribuir para o mapeamento do oceano, para atingir a meta de todo o oceano ser mapeado até 2030.

– Que balanço faz desta participação?

A nível pessoal, faço um balanço muito positivo. Enquanto jovem e cientista no início de carreira, ter a oportunidade de participar num evento internacional de alto nível, como este, é muito importante para entender o processo de tomada de decisão. A nível de resultados da conferência para a conservação do Oceano, existiram algumas conquistas, com destaque, ao apoio a uma moratória à Mineração no oceano Profundo pelas nações do Pacífico Palau, Fiji e Samoa, e pelo presidente francês, Emmanuel Macron; ou o anúncio de investimento de 10 mil milhões de euros por parte dos países na proteção do oceano para atingir a meta de proteger 30% do Oceano até 2030. A nível nacional, Portugal renovou alguns compromissos já feitos, como estabelecer 30% de áreas marinhas protegidas e de atingir o bom estado ambiental em todo o espaço marítimo até ao final da década, meta que deveria ter sido já atingida em 2020, de acordo com outras diretivas europeias. Por isso, apesar de pequenas conquistas, visto que há metas ambiciosas a cumprir dentro da Agenda 2030, gostaria de ter visto compromissos mais ousados e mais ambiciosos como resultado da conferência.

– Tem trabalhado em áreas de investigação à volta da temática dos oceanos?

A minha principal área de atuação é a investigação científica na área da Ecologia do Oceano profundo. Estou, neste momento, a fazer o doutoramento na Universidade de Salento, no Sul de Itália, onde estou a investigar a ecologia dos corais do oceano profundo (a cerca de 1500m de profundidade) de Cabo Verde.

– É uma bióloga do mundo. Portugal não apoia os jovens cientistas, levando-as a abandonar o país?

Na minha opinião, ser cientista é ser um pouco mais cientista do mundo do que do nosso país. O mundo científico é internacional e o conhecimento científico beneficia muito com colaborações internacionais. No entanto, a falta de investimento na ciência, principalmente nas ciências ambientais, dificulta muito a realidade de jovens cientistas, quer em Portugal, quer em vários países do mundo. A maioria dos contratos dos cientistas em início de carreira são à base de bolsas de investigação, o que contribui para uma situação de precariedade e instabilidade.

– O que entende que tem que ser feito pelos oceanos?

Como disse anteriormente, o ano de 2030 é um ano crucial para a conservação do Oceano. Estamos atualmente nas Décadas das Nações Unidas da Ciência do Oceano e para a Recuperação dos Ecossistemas. Pessoalmente, penso que precisamos de decisões ousadas por parte dos decisores políticos. Precisamos urgentemente de estabelecer e gerir novas áreas marinhas protegidas, de restaurar os ecossistemas degradados e de fazer uma gestão dos recursos marinhos, baseado no conhecimento científico e aplicando o princípio da precaução. Precisamos de mais investimento nas ciências do mar e na criação de empregos sustentáveis no Mar.

– Os jovens têm um papel importante na defesa dos oceanos?

Sem dúvida! Durante o Fórum, António Guterres pediu desculpa aos jovens pela sua geração não ter protegido o Oceano. Esta foi, para mim, uma das declarações mais impactantes. Os jovens têm um papel importantíssimo na defesa do Oceano, pela simples razão que somos os “herdeiros” de um Planeta em ameaça, facto que traz muita insegurança quanto ao nosso futuro. Além disso, a nossa geração é a geração mais qualificada de sempre! Os jovens contribuem com ideias frescas e contribuem com a sua empatia e visão de mundo. Acho que nós, jovens, entendemos mais rapidamente que a luta pela conservação do Oceano e do Planeta é também uma luta contra as desigualdades sociais. Mas também temos muito que aprender com as outras gerações! No fundo, o que precisamos é de uma perspetiva intergeracional.

– Quais são os principais problemas dos nossos oceanos?

Infelizmente, o Oceano enfrenta vários problemas. As consequências das alterações climáticas no Oceano são um dos cenários mais assustadores, dada a importância do Oceano na regulação do clima do Planeta. As alterações climáticas estão a provocar mudanças irreversíveis no oceano e a pôr em causa a biodiversidade marinha. Além disso, existem diversas formas de poluição muito preocupantes que ameaçam várias espécies marinhas, sendo, obviamente, a mais conhecida a poluição por plástico. A má gestão dos recursos de pesca e a utilização de artes de pesca destrutivas comprometem a saúde de vários habitats marinhos. Estamos a viver um verdadeiro estado de emergência oceânico!

– O que pode ser feito para um futuro melhor?

Penso que se cada cidadão entender o poder que tem, no seu dia-a-dia, o mundo e o futuro podem ser lugares melhores. A educação é uma ferramenta muito poderosa. Sugiro que o leitor aprenda um pouco mais sobre o funcionamento ecológico do Planeta, como tudo está conectado e equilibrado e como a nossa ação está a pôr em causa esse equilíbrio ecológico. Depois, é só passar a mensagem aos amigos, aos vizinhos e, em comunidade, começar a trabalhar juntos para um futuro melhor. A vontade de ação é contagiosa!

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